O projeto e implantação de um sistema de distribuição é condicionado por diversos fatores que dependem do produto, da empresa e da estrutura do mercado.
Da análise e ponderação desses fatores em cada caso particular se poderá deduzir, em um sentido geral, se o sistema mais adequado será a venda direta ou a venda indireta, ou uma combinação de ambas em algum aspecto.
O produto ou objeto de venda
A natureza do produto é o primeiro fator determinante.
Em termos muito gerais, pode-se dizer que os bens industriais requerem a venda direta, ao passo que os bens de consumo são mais bem comercializados com a venda indireta.
Um aspecto importante relativo à natureza do produto é a necessidade de sua acomodação à situação de uso ou de consumo: quanto maior for a necessidade e o trabalho de acomodação, mais necessária será a venda direta ou, na falta dela, o circuito curto.
Por outro lado, o grau de familiaridade dos consumidores ou usuários com o produto também influi nas decisões comerciais.
Quanto menor for o grau de familiaridade, mais necessária será a venda direta e/ou o circuito curto.
O consumidor ou usuário pode conhecer ou desconhecer a utilidade e aplicação do produto, ou ambas ao mesmo tempo.
No primeiro caso, os produtos exigem convencimento; no segundo, explicação.
Às vezes se fala da “complexidade técnica do produto” como critério ou fator condicionante da venda direta.
Em nossa opinião, isso é pouco acertado, porque um produto pode ser tecnicamente muito complexo e, contudo, o consumidor ou usuário estar já familiarizado tanto com sua utilidade, como com sua aplicação.
Se é evidente que a complexidade técnica de muitos produtos aumenta devido aos avanços tecnológicos, por outro lado, é também cada dia maior o grau de familiaridade com produtos tecnicamente complexos e que o consumidor compra e usa sem necessidade de maiores explicações.
Um bom exemplo é o televisor.
Muitos produtos ou artigos que anos atrás eram considerados tecnicamente complexos e, portanto, sua comercialização exigia um trabalho pessoal de venda (explicação e convencimento), hoje em dia se compram e vendem pelo correio (câmeras fotográficas, aparelhos de rádio e de vídeo, lava-pratos, etc).
O terceiro aspecto que afeta o produto é sua utilidade para os consumidores.
Um produto tem uma utilidade básica e uma utilidade adicional.
Quanto maior for sua utilidade básica, mais necessária e factível é a venda direta ou, na falta dela, o circuito curto (estabelecimentos especializados).
Uma grande utilidade adicional, por sua vez, supõe e justifica um elevado valor do produto, que permite cobrir os custos da venda direta ou os que derivam da venda em poucos estabelecimentos especializados, e justifica que o comprador dedique tempo à busca e ao estudo da compra do produto.
Finalmente, o grau de absorção do poder de compra dos consumidores ou usuários, ou o valor dos produtos, afeta também os canais de distribuição adotados.
Quanto maior for o grau de absorção do poder de compra ou, o que é o mesmo, o valor dos produtos, mais necessária será a venda direta.
Por outro lado, um valor elevado dos produtos faz com que esse tipo de venda seja possível e rentável.
Nos produtos de valor reduzido dificilmente se cobrirão os elevados custos venda direta.
Além disso, há uma questão que tem peso ainda maior.
Quando se trata de artigos ou produtos de pouco valor, que, portanto, não precisam nem de explicação nem de convencimento, o consumidor prefere não perder tempo com a visita pessoal de um vendedor.
Mesmo no caso da venda por correio, raras vezes compensará o esforço de fazer um pedido por escrito.
Jornais e outras publicações são produtos que supõem frequência e regularidade nas compras; além disso, o leitor da imprensa diária, em particular, quer encontrar o jornal em alguma das bancas de seu percurso habitual, evitando os longos deslocamentos para obtê-lo. Por outro lado, uma publicação periódica é também um objeto de consumo rápido, que perde seu valor quando fica defasado no tempo. Todas essas características da imprensa diária e das revistas especializadas exigem do setor industrial a comercialização indireta, com uma rede de varejistas. |
A estrutura da empresa e a distribuição
Na estrutura da empresa percebem-se três aspectos que afetam a distribuição: a gama de produtos, sua posição no mercado e sua capacidade financeira.
Quanto mais ampla a gama de produtos, mais factível será a venda direta.
A situação oposta só pode ser compensada pelo elevado valor e pela utilidade adicional dos produtos.
Assim, por exemplo, a empresa Caterpillar (maquinaria pesada, motores e tratores) pode vender diretamente aos compradores, apesar de ter uma gama reduzida, devido ao elevado valor de seus produtos.
A Avon vende a domicílio porque conta com uma gama de produtos cosméticos ampla e profunda.
Para a empresa que só fabrica um tipo de sabonete, dificilmente será possível e rentável vendê-lo a domicílio.
A posição de uma empresa no mercado influi em sua liberdade de ação para o projeto de um sistema de distribuição.
Uma posição forte permite escolher entre uma maior variedade de sistemas de comercialização.
Finalmente, quanto menor for a capacidade financeira de uma empresa, mais arriscada será a venda direta ou o circuito curto, pelo aparato organizativo, pelo custo e, consequentemente, pelo investimento que ela supõe.
Muitas empresas, que, levando em consideração outros critérios, deveriam utilizar a venda direta, não podem fazê-lo por falta de recursos financeiros.
A estrutura do mercado
O número e a dispersão dos consumidores ou usuários determinam poderosamente as possibilidades da venda direta.
Quanto mais numerosos e mais dispersos, mais difícil e menos rentável é esse tipo de venda.
Esta conclusão explica o fato de que a forma mais corrente de comercialização dos produtos se faça através de varejistas, embora mais cara ao consumidor ou ao usuário individual.
Pelo contrário, quando o consumidor ou o usuário final é a empresa industrial, um organismo estatal, uma paraestatal ou um hospital, cujo número é reduzido em comparação com o consumidor individual, é mais viável a venda direta.
O mesmo critério justifica também a utilização de aparelhos automáticos e a venda pelo correio.
Outras características que definem a estrutura do mercado são os hábitos de compra.
Existem vários fatores que os definem.
Assim, por exemplo, quanto aos bens de consumo, é estudado os seguintes hábitos:
- Frequência ou regularidade da compra, isto é, lapso de tempo entre uma compra e outra de um mesmo produto (replacement rate).
- Duração do consumo (time of consumption).
- Tempo empregado na busca do produto (searching time).
Segundo estudos, um produto que acusa um curto lapso de compra, um consumo rápido e um breve tempo de busca, exige, para sua comercialização, a venda indireta de varejistas e uma ampla cobertura do mercado (distribuição extensiva), ao mesmo tempo que permite a automação na venda (aparelhos automáticos, supermercados, etc), com a condição de ser mínima ou nula a necessidade de acomodação do produto.
Também o simples hábito dos consumidores de comprar determinado produto em um tipo de estabelecimento ou outro condiciona o fabricante à utilização do canal de distribuição.
Também influem na necessidade da venda direta a importância das funções que os comerciantes executam e a forma pela qual o fazem.
A falta de funções importantes, ou a deficiência em sua execução, por parte dos estabelecimentos (explicação e convencimento com base em venda ativa, financiamento, serviço pós-venda, etc) em muitos setores, sobretudo em produtos e equipamentos industriais, obrigou os fabricantes a afastarem-se desse tipo de comércio e a se lançarem à venda direta.
Um quarto fator derivado da estrutura do mercado é o grau de penetração por parte dos distribuidores e a gama de produtos que oferecem.
Quanto maior for o grau de penetração e, portanto, mais forte a posição dos distribuidores no mesmo, mais difícil e menos necessária será a venda direta.
Se determinado setor ou uma determinada zona estiver dominada por um ou vários distribuidores, será muito mais difícil chegar ao consumidor ou usuário final diretamente.
Por outro lado, isso indica que, ou os distribuidores executam as principais funções do comércio, ou os consumidores e usuários finais sentem fortes preferências pela compra no distribuidor, preferências que podem ser pessoais, geográficas e outras.
Vencer uma resistência à compra direta, decorrente da existência de preferências pelos distribuidores locais, exige tempo e dinheiro, tornando mais difícil o êxito, embora não impossível.
No que se refere à estrutura da gama de produtos dos distribuidores, quanto maior for sua amplitude e profundidade, mais difícil e menos conveniente será a venda direta por um fabricante com uma gama de produtos reduzida.
A não ser que a empresa fabricante ostente uma situação de privilégio ou monopólio pelas características de seu produto (isto é, que este não seja substituível por outro igual ou semelhante da concorrência), o consumidor ou usuário final preferirá abastecer-se no estabelecimento local onde costuma encontrar uma diversidade de artigos, cada um deles em diferentes variantes.
Isto é válido tanto quando se trata de bens de consumo com relação ao varejista, como caso se refira a bens de uso durável, com relação ao comércio especializado, ou a artigos industriais no que tange ao distribuidor.
Da mesma forma, quanto maior o grau de competição em um setor, mais se justifica e mais necessária é a venda direta e/ou o circuito curto.
Os produtos agrícolas constituem aqui uma exceção, já que, apesar da concorrência, o circuito de distribuição é longo.
Embora a venda direta seja mais custosa, tanto do ponto de vista organizacional como do custo de distribuição, ao aumentar o grau de competitividade no mercado, torna-se mais necessário liberar-se dos distribuidores.
A venda direta permite um melhor controle da comercialização, assim como a possibilidade de reagir com maior rapidez e eficácia aos gostos e às necessidades do comprador e às ações da concorrência.
Um último fator seria a velocidade do desenvolvimento do setor, assim entendidos o número e a rapidez das mudanças tecnológicas e econômicas.
Quanto maior for a velocidade, mais conveniente será a venda direta.
Este critério tem uma importância decisiva no caso dos produtos e equipamentos industriais.
Leia mais em:
- Entenda a formas de venda direta
- Entenda as formas de venda indireta
- Entenda os tipos de distribuição
- Como entender os sistemas de canais de distribuição
- Entenda quais são os objetivos de política de distribuição
- Entenda a função da distribuição
- Entenda quais são as funções do comércio
Fonte: José M. Veciana Vergés – Doutor em Ciências Econômicas pela Universidade de Frankfurt, Catedrático e Diretor do Departamento de Economia de Empresas na Universidade de Barcelona.