Estabelecidos os princípios técnicos do mundo da empresa de negócios, que não constituem exceção no mundo do trabalho em geral, vejamos a situação que encontra a mulher executiva ou aquela que aspira a essa posição.
Pensando nas numerosas secretárias, datilógrafas, bancárias, comerciárias, enfermeiras, etc, que realizam pacientemente e resignadamente seu trabalho, vêm-nos à mente o que aconteceria se uma organização feminina (sindicato feminino) convocasse uma greve.
O colapso seria total!
Na Islândia, até a primeira-ministra aderiu a uma greve feminina, em outubro de 1985.
Jane Tracy (Harvard Business Review, julho-agosto, 1972) explica por que, apesar do princípio de Peter (na hierarquia, cada empregado tende a elevar-se até o seu nível de incompetência), as coisas não vão pior; descreve que nas organizações há uma para-hierarquia de talento administrativo para quem não é válido o princípio de Peter: as secretárias.
São membros de uma classe subordinada, a quem foi restringido o acesso a postos superiores e não têm oportunidade de avançar para uma posição em que seriam incompetentes.
A barreira sexual as obriga a se satisfazerem realizando a mesma função, ano após ano, com eficácia.
A crença de que as secretárias são as que realmente fazem funcionar uma empresa (e as enfermeiras, os hospitais) não é uma piada.
Estas para-hierarquias são o adesivo que mantém nossa sociedade unida.
Sem elas, os negócios, os governos, a medicina e a educação há muito tempo teriam entrado em colapso sob o peso da incompetência acumulada.
Conclui Jane Tracy:
“Para poder sobreviver, uma hierarquia dominante deve criar e manter uma para-hierarquia composta de membros de uma classe subordinada aos quais não se aplica o princípio de Peter.
Esta classe subordinada foram historicamente os escravos, os negros e, na atualidade, são as mulheres”.
Este estudo de J. Tracy, professora adjunta de management na Faculdade de Administração de Empresas da Universidade de Ohio, defende que a única conclusão lógica para conservar as atuais organizações é proibir movimentos como a igualdade de oportunidades, o feminismo, a participação dos empregados, etc.
Se esta solução é inviável, é preciso evoluir para estruturas horizontais antes que seja muito tarde.
Não se pode conseguir a igualdade real se não se educa profissionalmente a mulher para competir com os homens em seu terreno.
A direção de empresas não é um emprego, é uma profissão dinâmica e mutável, sempre criativa.
Foi dito que é a arte mais antiga e a profissão mais jovem.
Para dirigir uma empresa é preciso dominar algumas técnicas, alguns instrumentos, mas a arte de dirigir, de conduzir as ações de pessoas para um objetivo, é muito mais complexa e aprende-se principalmente exercitando-a.
Mulheres que trabalham fora de casa nos Estados Unidos
O gráfico mostra o espetacular aumento da porcentagem de mulheres que trabalham fora de sua casa nos Estados Unidos. Os números, evidentemente, se referem ao total de mulheres recenseadas naquele país. Do escasso 43% que haviam conseguido um emprego em 1970 passou-se a quase 54% em 1984. O fato mais significativo é que a curva de crescimento continua marcando uma importante ascensão, indicativa do interesse que tanto as mulheres como a própria empresa têm em aumentar uma participação que enriqueça todas as partes.
A educação feminina
Há trinta anos, os pais que mandavam as filhas fazer estudos superiores era para que aprendessem alguma das carreiras consideradas adequadas para a mulher: Magistério, Enfermagem, Filosofia, Letras ou Pedagogia.
Para as que mostravam uma vocação definida, se lhes permitia estudar Medicina, Direito, Engenharia, Ciência, etc e estavam nas faculdades em minoria frente aos estudantes varões.
Com frequência comentava-se que a universidade era um canteiro de noivos e possíveis maridos para as jovens.
A evolução social favoreceu o despertar universitário das vocações femininas, e a presença da mulher nas diferentes faculdades já não é um fato insólito.
Que acontece nas escolas de Direção de Empresas?
Até 1963, a Universidade de Harvard não admitia mulheres; em 1973, 5% das estudantes eram mulheres; em 1979, 25%, a mesma porcentagem de Stanford, ao passo que na Universidade de Columbia (Nova York) chegava a 30%; na Inglaterra, em 1981, a porcentagem era de 40%; na ESADE, de Barcelona, no curso 1984-1985, havia 25% de alunas. *
* N.R. Segundo Irany Novah Moraes, in Perfil da Universidade de São Paulo (Pioneira/EDUSP, 1986, p. 118), o quadro feminino na USP seria o seguinte: 43% no geral, 10% na área de Ciências Exatas e 60% na de Humanas.
Os pais atuais educam suas filhas para que possam manter-se com sua profissão.
Sabem que o matrimônio não é uma solução econômica estável (veja-se o número de casais separados, divorciados e de viúvas).
Aceita-se que a mulher possa, e às vezes deva colaborar no sustento familiar e que esta não é uma responsabilidade exclusiva do marido.
A mãe universitária, que enquanto seus filhos são pequenos abandona o exercício de sua profissão, sabe o problema que representa reciclar-se de novo e reincorporar-se à vida profissional.
Para a mulher, renunciar à vida de família vai contra a sua natureza, mas renunciar ao trabalho para o qual está preparada, também.
A integração da personalidade feminina no mundo da empresa, em seu nível executivo, é conveniente para a empresa e para a mulher.
O contexto em que se move a mulher de hoje, entre a tradição e a mudança, reclama sua participação no exercício da profissão diretiva da mesma forma que o homem, mas com sua identidade específica.
A empresa precisa de sangue novo e criatividade na direção.
Gostaríamos de relativizar os termos masculino e feminino.
A pessoa humana não está condicionada pelo sexo.
A nível de pessoas não existe o feminino e o masculino.
O feminino só existe frente ao masculino, e vice-versa.
É verificando diferenças com o masculino que o feminino assume sua identidade, mas somente assim; o feminino, sem comparação com o masculino, não existe, e vice-versa.
A empresa tem necessidade da mulher na direção, porque este poder está monopolizado pelo homem e ela pode contribuir com sua identidade e imaginação.
É também evidente a conveniência da entrada dos homens na vida doméstica e familiar, monopolizada pelas mulheres.
“É muito perigoso ser dona-de-casa”, escreveu Elisa Lamas, referindo-se a uma pesquisa do primeiro semestre de 1984, realizada na Espanha pelo Centro de Estudos de Difusão dos Direitos do Homem (e da Mulher) da Cruz Vermelha, em colaboração com a European Society of Biosociety.
Descobriu-se que 87% das donas-de-casa espanholas sofrem de um conjunto de sintomas patológicos como consequência de sua ocupação habitual: depressão, insônia, ansiedade, sensação de solidão, desamor, etc.
Trabalham de 10 a 14 horas por dia sem nenhuma autoestima por seu trabalho.
Cerca de 92% se automedicam com analgésicos, anti reumáticos, etc.
Dentre elas, 65% toma hipnóticos ou antidepressivos.
Não têm nem salário nem aposentadoria e, para cúmulo da ironia, figuram nas estatísticas nacionais como população não ativa.
A imagem feminina criada pelo homem como seu complemento faz parte do mito da feminilidade.
Ser esposa e mãe é muito respeitável, mas não é a única aspiração de uma mulher.
Incremento de postos de trabalho nos Estados Unidos desde 1973
O gráfico permite apreciar como do total de 28 milhões de novos postos de trabalho que foram criados nos Estados Unidos entre os anos de 1974 e 1984, em torno de 14 milhões, foram ocupados por mulheres, enquanto somente seis o foram por homens. Este aumento espetacular não guarda relação, contudo, com o relativamente escasso número de mulheres que chegam a cargos diretivos.
Qualidades do dirigente
Para dirigir uma empresa é necessário capacidade para saber tomar decisões acertadas que geram lucros.
Esta habilidade é complexa; requer objetividade e sensibilidade para captar as possibilidades de ação e as limitações dos dirigidos; exige um discernimento lúcido e uma vontade firme.
A imagem da pessoa executiva identificou-se com as qualidades etiquetadas como varonis:
- Agressividade, competitividade, estabilidade emocional, confiança em si mesmo, ambição de responsabilidade, objetividade, firmeza e até violência, se necessário for.
O estereótipo de mulher aceito pela maioria da sociedade é:
- Emocional, subjetiva, vulnerável à crítica, temerosa frente ao risco, dubitativa, intuitiva, compreensiva, consciente dos sentimentos do outro, dependente, etc.
Em vários estudos realizados nos Estados Unidos sobre a conduta da mulher e do homem nas funções diretivas (Rousell, em 1974, entre reitores de universidades; Minor, em 1974, entre chefes de grandes lojas; e Stracke, em 1986, entre chefes administrativos), nos quais foi utilizado um teste pessoal de 16 fatores, não se detectaram diferenças entre agressividade, profissionalidade, sugestibilidade e, até mesmo, resultados opostos ao dos estereótipos, e decisão, objetividade, estabilidade emocional e passividade; ou seja, os resultados das mulheres estavam mais próximos da imagem de líder do que os dos homens.
Depois do teste pessoal foram pesquisados os superiores e os inferiores do pessoal em questão.
Os superiores classificaram os chefes segundo os estereótipos correntes de homem e mulher, em desacordo com sua própria opinião.
Os subordinados descreveram a direção das mulheres como socioemocional e a dos homens como orientação de trabalho e profissionalidade, opinião expressa independentemente do sexo dos subordinados.
Não se aceitaram facilmente capacidades masculinas na mulher de chefia e, menos ainda, capacidades femininas no homem de chefia.
O modelo preestabelecido predominava tanto nos de cima como nos de baixo, tinha mais força o sexo do chefe do que as qualidades da pessoa tal como ela mesma se via.
A falta de credibilidade do superior nas capacidades masculinas da mulher diretora diminui o poder desta com relação a seus subordinados.
A credibilidade de cima condiciona a credibilidade de baixo, e será difícil para a mulher sem poder de promoção ou de decisão motivar um subordinado.
Se a mulher é conhecida por seu superior como o estereótipo feminino, lhe será extremamente difícil exercer um estilo pessoal de direção.
Os indivíduos que ocupam posições de liderança tendem a desenvolver as faculdades que lhes permitem enfrentar as situações.
Os traços de personalidade não são estáveis, podem fomentar-se como resposta às circunstâncias.
A grande dificuldade da pesquisa de formas de conduta diretiva é a pouca participação feminina.
Há pouquíssimos casos em que mulheres e homens estão numa proporção de 50% para poder tirar conclusões válidas.
Evidentemente, à medida que sobe o nível hierárquico na empresa, diminuem as diferenças.
Há muito mais semelhança entre um gerente masculino e um feminino do que entre um caminhoneiro e uma empregada de escritório.
É curioso que esta análise de diferenças seja acentuada pela desigualdade de representação masculina e feminina.
No dia em que se conseguir uma distribuição mais equitativa não se produzirá, e se chegará à conclusão de que, na realidade, as naturezas humanas apresentam muito mais semelhanças do que diferenças.
A cultura das funções segundo o sexo fez com que se vissem mais as diferenças, quando é muito mais importante detectar os traços comuns.
Todos os estudos sociológicos levam a esta conclusão.
A integração de todos os elementos que um diretor deve utilizar (pessoas, dinheiro, tempo, relações, elementos de produção e demais ativos) exige algumas aptidões pessoais, uma habilidade para planejar, organizar, coordenar, motivar, controlar, avaliar, delegar e resolver problemas ou prevê-los.
Reif, Newstrom e Moncka demonstraram que a mulher tem capacidade de planejar fortes atributos para o raciocínio abstrato e destreza de análise; é adaptável e pode motivar-se por objetivos profissionais.
A mulher, em resumo, não tem nenhum handicap psicológico que possa limitar alguma função diretiva.
A mulher nos diversos setores profissionais dos Estados Unidos
O gráfico ilustra a evolução da presença da mulher em várias profissões entre os anos de 1970 e 1983. A profissão de secretária é a que proporciona maior ocupação, ao passo que no campo da gerência é onde há menos mulheres.
É interessante referir-se a um cientista do Instituto de Pesquisa da Universidade de Stanford que, em outubro 1980, falou da necessidade de combinar o estilo Alfa e o estilo Beta, mais feminino.
A chefia Alfa baseia-se num método de pensamento analítico, racional e quantitativo; utiliza relações hierárquicas de autoridade; é direto e agressivo; trata competitivamente de conseguir uma solução de tudo ou nada; percebe a mudança como exótica e desestabilizadora e recorre à ordem para controlá-la.
O estilo Beta baseia-se num método de pensamento sintetizador, intuitivo, qualitativo e num estilo de poder contextual e relacionado; é capaz de enfrentar as mudanças; não crê numa só solução de uma hierarquia fixa, mas em mudanças fluidas de poder para fazer frente a cada situação; integra diferenças e métodos; em vez de buscar o controle absoluto, o que busca é a mudança como processo de adaptação de forma gradual por fases, e a ordem vai surgindo de uma aparente desordem; isto requer tolerância da ambiguidade e fé em que a ordem prevalecerá.
Não há nenhum indicador de que essas tendências de conduta sejam inatas num ou noutro sexo.
Tanto homens como mulheres mostram características de ambos os estilos quando ocupam postos de direção.
Contudo, pôde-se comprovar que os estereótipos sexuais, a ideia que se tem dos sexos e o que se espera deles, condicionam e polarizam esses tipos de conduta.
Também não se comprovou que as mulheres que subiram na empresa, alcançaram maiores êxitos utilizando melhor do que os homens o estilo Alfa.
O pesquisador de Stanford vê nisto um perigo, porque a atual paralisia de liderança é, em parte, função do domínio do tipo masculino de chefia e, se continua sendo o único modelo, é provável que nos leve cada vez mais em direção a uma sociedade autoritária e homogênea.
É necessário equilibrar o estilo Alfa e Beta de liderança, tanto em homens como em mulheres, para romper o ponto morto e conservar uma sociedade livre, diferenciada e sem hierarquias baseadas no sexo.
Leia mais em:
- Entenda os obstáculos que a mulher encontra para chegar à direção
- Entenda as estratégias da mulher
- Entenda a mudança de estilo
- Entenda o que fazem as corporações americanas
- Entenda a mulher empresária
- Como entender a mulher na empresa
- Entenda a organização administrativa
Fonte: Mercedes Pániker – É licenciada em Ciências Químicas pela Universidade de Barcelona. Diplomada pelo IESE, dirigiu sua própria empresa familiar. É consultora do Centro Internacional de Comércio de Genebra.