Um dos fenômenos econômicos mais importantes das três últimas décadas constitui a invasão dos mercados internacionais por empresas japonesas.

É preciso localizar as causas desse êxito em certos métodos de direção de empresa que têm algumas características muito diferentes das utilizadas no mundo ocidental.

O Japão é o pais que melhor tem sabido aplicar seus avanços tecnológicos em sua economia, refletindo-se isso em seu maior crescimento de demanda interna e do PNB real, bem como em sua menor taxa de desemprego.

Dirigir é uma atividade complexa, que cada um realiza a seu modo.

Mas no hemisfério ocidental temos uma forma bastante semelhante de atuar quer os dirigentes sejam brasileiros, espanhóis, alemães, franceses, ingleses ou norte-americanos.

Desde que as empresas japonesas invadiram quase todos os setores da economia ocidental, com frequência nos temos perguntado sobre as causas desse êxito.

Ao analisar o modo de dirigir das empresas japonesas, descobrem-se características substancialmente diferentes dos métodos ocidentais.

Essa análise não po­de constituir um tema separado de seu contexto: a empresa japonesa e seu ambiente, pois suas peculiaridades administrativas parecem aprofundar suas raízes no fértil solo da cultura milenar daquele importante país.

A questão agora é saber se podemos transplantar esse estilo japonês de administração para o mundo ocidental, com igual sucesso.

Das pesquisas dos teóricos da administração nasceu a chamada Teoria Z (já adotada por algumas das importantes multinacionais do Ocidente), que será objeto de alguns comentários.

Pare­ce que está se generalizando no Ocidente a ideia de que a transculturação do modelo japonês pode vir a ser bastante profícua, valendo, portanto, a pena encarar esse desafio com seriedade.

Condições preexistentes no Japão

Para entender a consistência do estilo de dirigir nas empresas do Japão, é necessário assinalar primeiro as peculiaridades mais importantes que marcam sua maneira de ser.

Consideramos que essas peculiaridades são muito abrangentes, relacionando-se com a geografia, a raça, a história, a religião, a filosofia e o feuda­lismo.

Tudo isso se traduz numa idiossincrasia que, mesmo correndo o risco de simplificar em demasia, trataremos de sintetizar.

O Japão é um país que mantém tradi­ções enraizadas, apesar da influência ocidental.

Não se deve esquecer que é um arquipélago relativamente pequeno, mas com uma população bastante grande.

Seu isolamento foi prolongado, o que provocou uma grande unidade interna, reforçando um acentuado sentimento de separação do resto do mundo.

O subsolo japonês é muito pobre, por­tanto o país deve importar grande e diversificada quantidade de matérias-primas.

O empresário japonês está mui­to consciente dessa inferioridade frente ao resto do mundo.

O Japão tem, além disso, uma única raça e cultura.

Essa uniformidade cultu­ral foi um poderoso fator de coesão interna entre seus habitantes.

Daí que se pri­vilegie, há séculos, o sentido do grupo e do trabalho em equipe sobre as preocupações de individualidade.

Um terceiro fator é o prolongado isolamento histórico japonês, de cerca de 300 anos: desde o século XVI até o XIX.

Durante esse tempo, o Japão rejeitou todo contato com o mundo exterior.

Hoje em dia, o japonês se sente deslocado entre estrangeiros e tende sempre a buscar o contato com seus conterrâneos.

Suas relações com o exterior, embora pareçam exten­sas, são protagonizadas por uma reduzi­da porcentagem de sua população.

Mes­mo assim, os japoneses quase sempre vão em grupo quando viajam fora de seu país, algumas vezes para fazer turismo, mas geralmente para realizar alguma missão pa­ra a empresa em que trabalham.

Mesmo que fixem residência no exterior, em ne­nhum momento deixam de comunicar-se com seu país, através de sua empresa.

Outro fator fundamental que marca o modo de ser japonês é sua religião e sua filosofia.

No Japão há dois tipos princi­pais de religião, o xintoísmo e o budismo zen.

A primeira é a mais importante do Japão e é muito antiga.

Sua doutrina con­siste em adorar os antepassados imperiais e os espíritos ancestrais.

Na prática, essa religião traduz-se num tremendo senso de disciplina: de obediência aos maiores e do dever para com a pátria, a família e as empresas onde se trabalha.

A segunda religião é o budismo zen.

Sua doutrina é a harmonia do homem com a natureza: ambos fazem parte do mesmo ente criador; a vida humana não é mais do que um momento efêmero do ciclo natural.

Esse sentimento constitui uma cosmovisão panteísta que desindividualiza a vida humana e a orienta para a família, a empresa e a pátria.

As religiões não deixam o japonês indiferente quanto à maneira de comportar-se.

Não são religiões intelectuais, mas voltadas para o comportamento.

Além dessas religiões com grande coerência mútua, é preciso acrescentar a filosofia do confucionismo, que deixou marcas indeléveis em quase todos os países do Extremo Oriente.

A filosofia de Confúcio reforça a ideia de que os interesses do indivíduo devem subordinar-se aos da família e da nação.

Postula uma preocupação humanista, baseada no conceito do homem moralmente superior e de uma sociedade bem ordenada.

Por outro lado, é preciso levar em con­ta que o Japão passou por sete séculos de feudalismo e, portanto, é um país que não viveu a emancipação dos grêmios e do capitalismo individual do pequeno empresário.

Encontrou-se na idade contemporânea com as tecnologias que propiciam a grande empresa ou corporação, ou se encaixam nela.

Mas, apesar disso, são muitas as pequenas e médias empresas no Japão.

É preciso acrescentar também que, a partir da Segunda Guerra Mundial, o Ja­pão se converteu numa sociedade sem classes, que contrasta – porém não é contraditório – com o profundo sentido da ordem e da hierarquia que impera na sociedade e com o estímulo à concor­rência e à superação.

Mas essa emulação não leva a confronto entre indivíduos, pois cada japonês a encara como um de­safio a si mesmo.

Ou seja, todo japonês exige de si até o limite, e se esforça por melhorar constantemente ao longo de toda sua vida.

O resultado das forças históricas, geográficas e sociológicas que citamos, dá origem a uma estrutura social na qual se devem distinguir as seguintes notas:

  • Consciência de grupo.

Em contraste com o Ocidente, no Japão conta mais o grupo do que o indivíduo.

Todo indiví­duo está integrado num ou mais grupos.

Sua consciência o leva a submeter-lhe sua individualidade.

Portanto, os objetivos do grupo estão acima dos individuais.

Além disso, a divisão do trabalho faz-se mais entre grupos do que entre indivíduos.

A orientação do comportamento e da integração individual é guiada pelos objetivos do grupo.

  • Caráter comunal.

As empresas e as instituições são, na verdade, comunidades onde o indivíduo exterioriza todo seu ser social.

Ali encontra a satisfação de amizade, relação pessoal, expansão cultural e realização do aperfeiçoamento profissional.

As relações de trabalho não têm caráter contratual, mas de convivência.

Daí que sejam consideradas como compromissos de longo prazo ou de prazo indefinido.

  • Harmonia.

Tem mais importância a harmonia do que a justiça.

Se duas pessoas brigam, as duas são culpadas do rompimento da harmonia.

Assim como no Ocidente todos procuramos sobressair, no Japão todo mundo tem que adaptar-se e desaparecer no seio da comunidade em que se encontra.

“O prego que sobres­sai tem que ser martelado até que se iguale aos outros”, reza um velho provérbio.

Os velhos provérbios ainda alimentam a sabedoria japonesa, que se transmite por tradição.

Para qualquer situação pode-se procurar um provérbio, que terá mais validade do que possa parecer a um obser­vador ocidental.

De tudo isto aflora um perfil que po­deria ser definido, de maneira muito significativa, com os seguintes traços quando se apresenta diante do ocidental:

  • Mentalidade racional e lógica, rigorosa na análise.
  • Imaginação controlada pela razão e aguçada pelo contraste pelos demais do grupo.
  • Disciplina e sentido do dever; responsabilidade diante do grupo.
  • Enigmático e indecifrável, que evita o frente-a-frente, não por duplicidade, mas por timidez.
  • Simplicidade, não dando importância ao ridículo e ao fato de aparentar que não sabe sobre muitos temas.
  • Perseverante e tenaz, não desanimando diante das dificuldades.
  • Negociador incansável que mantém firme sua posição.
  • Inquisidor e analítico até o fundo das questões.
  • Prudente e precavido, que assegura ao máximo o êxito dos passos a dar.

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Fonte: Barto Roig Amat – Doutor Engenheiro Industrial pela E.T.S. de Barcelona. Ex-presidente da European International Bu­siness. Membro da Academy of International Business. Professor titular do IESE.

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