Em tempos recentes exacerbou-se uma discussão que, em surdina, era permanente.
A causa da exacerbação foram os resultados negativos, às vezes espetaculares, que conheceram muitas empresas públicas em diversos países ocidentais.
Os que mais confiam na iniciativa privada atribuem parte importante destas perdas a uma ineficiência inerente a toda empresa pública.
Afirmam que esta é uma lei natural para a qual dificilmente se encontrarão exceções.
A falta de estímulos político-econômicos, o domínio da burocracia e a rigidez dos controles redundam numa arteriosclerose que se traduz em custos elevados.
A simplicidade e operatividade do objetivo do lucro, típico da empresa privada, não têm contrapartida no domínio público.
Os que, pelo contrário, defendem e sustentam a intervenção direta do Estado creem que essas perdas, pelo menos em boa parte, se originam da imposição pelo mesmo Estado de obrigações e limitações às empresas públicas, sem contrapartida alguma no lado positivo do demonstrativo de resultados.
Caso se exige das Prefeituras que os transportes públicos prestem gratuitamente o serviço aos aposentados, surge aqui um custo não compensado, causado pela utilização da empresa na redistribuição da renda.
Logicamente, se as Prefeituras compensassem monetariamente as empresas que prestam esse serviço, estas teriam reduzidos os prejuízos.
Influências sobre o resultado
Em outras palavras: o demonstrativo de resultados dessas empresas recolhe, em proporções diversas, dois tipos de efeitos que repercutem no seu resultado.
O primeiro deles é sua possível ineficiência, o que equivale a operar com custos superiores aos tecnológica e socialmente necessários.
O segundo, pelo contrário, tem sua origem nos problemas externos não compensados, ou nos efeitos indiretos de sua atuação.
Sobre os resultados da empresa pública também influem de maneira apreciável as exigências e limitações que resultam de sua utilização como instrumento de política econômica.
Assim, se a localização de uma empresa em determinada zona se deve ao desejo de promover seu desenvolvimento, os possíveis custos adicionais de uma localização antieconômica do ponto de vista da empresa não lhe devem ser atribuídos.
Se para favorecer a agricultura se obriga uma empresa produtora de eletricidade a vender o kW/h em zonas rurais a um preço claramente inferior ao que o mercado admitiria, a redução das receitas que a medida comporta não lhe pode ser imputada.
Não há dúvida de que existem exemplos de empresas públicas bastante ineficientes.
A imprensa tem divulgado casos claros de excesso de pessoal, de escasso rendimento (número de empregados por unidade de produto), ou de baixa qualidade dos bens produzidos.
Os especialistas estimam que entre as causas que levam a uma possível insuficiência cabe sublinhar as seguintes:
- Uma direção com escassa autonomia e frequentemente nomeada com critérios diferentes daqueles da competência profissional (é sabido que, em muitos países, políticos ocupam os cargos de responsabilidade, como fórmula para receber uma pensão ou compensar um mau resultado eleitoral);
- A maior vulnerabilidade frente às reivindicações trabalhistas de seu pessoal (isto se traduz em um quadro excessivamente numeroso e em remunerações superiores às que resultariam da situação do mercado de trabalho);
- A ausência de qualquer risco de desaparecimento (e com isto tanto os altos cargos executivos como o resto do pessoal não se veem impelidos a desenvolver o máximo esforço e a prestar a máxima atenção às suas decisões).
De todo modo, sobre a eficiência das empresas públicas muita coisa resta a discutir.
Não se pode generalizar nem chegar a conclusões apressadas, sem antes avaliar o impacto da estrutura do mercado, da dimensão da empresa e outras circunstâncias concretas.
A conjunção da ineficiência dos problemas externos não compensados obscurece o sentido que pode ter o saldo do demonstrativo de resultados.
Daí que, apesar das muitas dificuldades que encerra, em muitos países tenta-se quantificar os problemas externos que influem na empresa pública como instrumento de política econômica.
De tal modo que entre um resultado real – que recolheria a maior ou menor eficiência e poderia comparar-se às empresas privadas análogas – e o resultado contábil haveria a diferença correspondente ao valor das dificuldades impostas à entidade pública.
O esquema seria o seguinte:
Sem ter realizado essa depuração, toda comparação é vã e as discussões estéreis porque apoiadas em juízos apriorísticos de tipo dogmático.
Na França, por exemplo, a Régis Renault e a Elf-Aquitaine durante muito tempo tiveram índices de eficiência comparáveis aos de seus competidores privados.
Na Itália, por seu lado, uma comparação entre 700 empresas privadas e as que integram a holding IRI mostrou resultados semelhantes.
Uma opinião contra a expansão do gasto público Desde inícios do século e, mais concretamente, desde o fim da Segunda Guerra Mundial, o crescimento do Estado, tanto nos países democráticos como nos totalitários, foi espetacular. O despertar da demanda através da potenciação do setor público, pois o setor privado certamente não se dispunha a fazê-lo, foi o remédio econômico empregado em muitos países. Enquanto no início do século os gastos públicos dos países ocidentais representavam entre 10 e 15% do Produto Nacional Bruto, em meados da década de 70, tal porcentagem se situava entre35 e 45%. Contudo, parece que este crescimento espetacular chegou a seu fim. Os países onde governam partidos conservadores e liberais, como os Estados Unidos, a Grã-Bretanha, o Japão e a Alemanha Federal, parecem estar convencidos de que a eficácia e rentabilidade econômica não vem do setor público. Sua política econômica está baseada no fortalecimento do setor privado, máximo gerador de emprego. O crescimento do gasto público provoca maior esforço fiscal, com a consequente perda de parte da liberdade econômica do indivíduo. Por sua vez e paralelamente, as necessidades da economia estão esgotando e asfixiando a economia privada que, quando consegue financiamento, o faz a custos excessivos. Se pretendemos mover-nos dentro de um marco de rentabilidade e eficácia econômica, a solução é iniciar um amplo movimento para impor ao setor público comportamentos próprios da economia privada; é conduzir, por mais que custe, a economia pública pelo caminho da economia privada, isto é, exigir-lhe rentabilidade econômica. A via das subvenções políticas e do gasto público abusivo não pode ser suportada por muito tempo. Se agíssemos dessa forma, provocaríamos um grave perigo econômico, que não é outro senão a possibilidade de que o espírito empreendedor e de iniciativa da economia privada se enfraqueça. Sem economia privada, de que viveria o setor público que não é capaz de gerar suas próprias necessidades nem de rentabilizar seus custos? Juan Roseli Castortras, “Privatizar el sector público”, em Horizonte Empresarial, maio de 1984. |
O controle das empresas públicas na CEE As empresas públicas situadas em países da Comunidade Econômica Europeia (CEE) devem proporcionar informações de suas atividades à Comissão das Comunidades Europeias. Segundo a Diretriz 80/723/CEE, da Comissão das Comunidades Europeias, obrigam-se os Estados membros da CEE a fornecer à Comissão informação sobre as relações financeiras entre os Estados e as empresas públicas. Concretamente, a Comissão tem acesso à informação sobre:
Contudo, estão isentas da mencionada diretriz as empresas públicas cujas atividades não afetam os intercâmbios entre os Estados. |
As empresas públicas e os monopólios na Comunidade Econômica Europeia (CEE) A função que o tratado de Roma outorga às empresas públicas encontra-se essencialmente contida em seu Artigo 90, parágrafo segundo, que diz: “As empresas encarregadas da gestão de serviços de interesse econômico geral ou que apresentam um caráter de monopólio fiscal encontram-se sujeitas às regras do presente Tratado, particularmente às regras de concorrência…’’ O princípio geral que o Artigo 90 acolhe, em seu parágrafo segundo, é o de que os Estados, no que se refere as empresas públicas, não adotarão nem manterão nenhuma medida contrária às regras de livre competição que o Tratado de Roma encerra. Portanto, existe um princípio gerai de igualdade entre empresas públicas e empresas privadas. Com relação aos monopólios comerciais, o Artigo 37 do Tratado de Roma (CEE) diz textualmente que: “Os Estados membros adequam progressivamente os monopólios nacionais, que apresentam um caráter comercial, de tal forma que, ao expirar o período de transição, se assegure, nas condições de abastecimento e mercado, a exclusão de toda discriminação entre os cidadãos dos Estados-membros”. Os monopólios comerciais devem ajustar-se para evitar qualquer discriminação. Os monopólios fiscais, pelo contrário, podem existir, já que seu objetivo arrecadador é compatível com as normas do Tratado de Roma. |
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Fonte: Antonio Serra Ramoneda – Doutor em Ciências Econômicas e reitor da Universidade Autônoma de Barcelona, Espanha.