A empresa pública, existente até em países de longa tradição liberal-conservadora, vem sendo causa de uma antiga e inflamada polêmica entre economistas e políticos de diferentes tendências.
E enquanto ela se trava, a participação estatal na indústria e no comércio é um fato que marca a economia de todos os países.
Está estatisticamente demonstrado que, mesmo nos países onde com mais convicção se apoia a iniciativa e a propriedade privadas, o Estado alcançou um papel de protagonista na atividade econômica.
O famoso laissez faire, laissez passer, princípio liberal por excelência, é mais uma lembrança histórica do que uma realidade.
Hoje o Estado não se limita ao papel de árbitro na vida econômica, a ditar as normas que devem garantir o livre funcionamento do mercado.
Converteu-se em agente direto e seu comportamento determina em proporção não desprezível a alocação de recursos, o volume e a composição do produto nacional.
Segundo definição da Organização para a Coordenação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), “as empresas públicas são empresas que, como as privadas, produzem bens e serviços com o objetivo de sua venda a um preço que cubra aproximadamente seu custo de produção, mas que são propriedade do Estado ou estão submetidas ao seu controle”.
Costuma-se citar, como exemplos históricos remotos da atividade empresarial do Estado, as minas da Roma imperial e as denominadas “manufaturas reais” da monarquia francesa, entre outros.
Foram, porém, casos isolados e sua motivação, de tipo fiscal.
Tinham como objetivo suplementar as receitas do monarca, sempre insuficientes pelas deficiências do sistema tributário.
Mas já em épocas modernas, implantado o capitalismo, vigente à fé na iniciativa privada, eram muito escassas as empresas públicas; constituíam verdadeiras relíquias históricas que subsistiam pelos motivos financeiros mencionados – por exemplo, o monopólio do fumo em alguns países europeus – ou razões de segurança e ordem públicas, como era o caso da fabricação de armas ou de pólvora.
Somente em pleno século 20 ruíram as barreiras entre a iniciativa privada e pública, e o Estado irrompeu com força e sem inibições na atividade empresarial.
Além do mais, ele o fez utilizando instituições e figuras típicas do direito privado, como a sociedade anônima, sem que isso parecesse estranho ou paradoxal.
E hoje muitos cidadãos de países ocidentais, além de viajarem em trens de propriedade do Estado, possuem automóveis, consomem produtos ou se vestem com roupas fabricadas por empresas públicas, que existem na maioria dos setores da atividade econômica.
A burocratização é um dos riscos da empresa pública. O gráfico mostra a relação entre empregados de empresas públicas e privadas na Espanha, França, Áustria e Itália, países nos quais as primeiras adquiriram uma enorme importância. As figuras de cor azul representam a população empregada em empresas públicas; as de cor vermelha, a população empregada em empresas privadas.
Setor público e socialização
Frequentemente se considera a existência de uma correlação precisa entre o peso das empresas públicas e o grau de socialização ou de intervenção estatal em uma economia.
Isso não é totalmente certo porque a intervenção estatal pode realizar-se através de múltiplas vias, e por isso não é forçoso que a empresa pública tenha uma presença importante para que exista socialização.
Dentro da Comunidade Econômica Europeia, a Itália está entre os países onde a empresa pública tem mais peso, ao passo que a Dinamarca figura no extremo oposto da classificação.
Contudo é ideia corrente que a Dinamarca, como país escandinavo onde as correntes social-democratas sempre tiveram grande aceitação, conta com maior intervenção pública do que a Itália, nação que há anos tem governos favoráveis à iniciativa privada.
Em qualquer caso, as empresas públicas têm sempre um peso econômico importante e, em todos os países, controlam uma forte parcela de produção de bens e serviços.
Mesmo nos Estados Unidos, paraíso oficial da empresa privada, funcionam mais de sete mil empresas públicas, algumas delas de grandes dimensões.
O valor agregado que as empresas públicas geram no processo produtivo também pode servir como índice para medir sua eficácia. O gráfico revela sua magnitude na Espanha, França, Áustria e Itália.
As porcentagens relativas à participação na formação bruta do capital fixo geralmente superam com sobras as da população empregada e as do valor agregado.
Em parte, essa diferença pode ser atribuída a um maior esforço investidor das empresas públicas, originado no desejo do governo de lutar contra a crise.
Mas a explicação reside também, sem dúvida alguma, na concentração das empresas públicas em setores cuja tecnologia é fortemente intensiva em capital.
A produção de energia, as comunicações e os transportes são atividades que exigem volumosa e custosa infraestrutura material, e em muitos países tais atividades estão total ou parcialmente a cargo da empresa pública.
Esse fato desempenha um papel importante em algumas das explicações propostas.
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Fonte: Antonio Serra Ramoneda – Doutor em Ciências Econômicas e reitor da Universidade Autônoma de Barcelona, Espanha.