O desenvolvimento do homem em uma organização realiza-se por força pluridimensional.
A menos que se considerem os homens como simples módulos funcionais ou meras peças do sistema, seu desenvolvimento apresenta diversos aspectos que, em síntese, podem-se reduzir a quatro: (i) desenvolvimento para as funções específicas, (ii) desenvolvimento para o setor de atividade, (iii) desenvolvimento para o exercício da ação diretiva e (iv) desenvolvimento para integração dentro da empresa (inclusão).
Função, setor, direção e inclusão resultam, assim, as dimensões básicas através das quais se desenvolve a carreira profissional de um indivíduo na organização.
Desenvolvimento para as funções específicas
Os planos de desenvolvimento costumam dar especial atenção às habilidades e aos conhecimentos específicos para realizar na empresa funções básicas e insubstituíveis.
Essas funções (vendas, compras, produção, finanças, etc) exigem, na realidade, conhecimentos e potencialidades não apenas diversificadas, mas, de certa forma até mesmo contrapostas.
As capacidades para desenvolver e operar um processo de produção seguem uma orientação e exigem características muito diferentes daquelas que se exigem para organizar e pôr em ação um plano de vendas.
A carreira profissional deve ser deliberadamente orientada para alguma das funções básicas da empresa, com preferência clara sobre as outras.
A complexidade atual dos trabalhos das organizações empresariais impede que se preparem pessoas capacitadas, séria e profissionalmente, para três ou quatro funções básicas, o que exigiria alimentar um monstro com várias cabeças.
A diversificação dos programas universitários não consegue resolver esses problemas, que exigem reconsideração com vistas às funções básicas da organização e às suas exigências específicas mais fundamentais.
Desenvolvimento para o setor de atividade
Da mesma forma, ao encarar o desenvolvimento dos indivíduos, a organização coloca ênfase especial no modo de fazer as coisas peculiares do setor de atividade em que ela está engajada.
E, mais ainda, a maneira característica de levar a cabo a atividade em determinada organização.
É evidente que uma mesma função (a produtiva por exemplo), se exerce mediante esquemas diferentes, dependendo dos setores em que se opera, as situações de emergência que se apresentam numa agência de viagens em temporada de férias, numa fábrica de brinquedos durante a época natalina ou numa usina de açúcar em plena safra, envolvem circunstâncias peculiares que exigem conhecimentos e habilidades muito diversificados.
O objetivo da carreira profissional deve focalizar o setor de atividade onde irá ser exercida.
Esse fato deve ser levado particularmente em conta quando a empresa depende de um modo verdadeiramente próprio de realizar suas atividades, sobretudo se isso constitui uma característica competitiva sua.
Torna-se então necessário que essa maneira peculiar de agir seja transmitida à equipe de forma bastante clara e definida para que não se perca com o tempo e com a mudança das pessoas.
Posto que o desenvolvimento para a função e para o setor sejam muito importantes, a carreira profissional não deveria ficar circunscrita somente a essas duas únicas dimensões.
É preciso sublinhar a importância que encerram para o progresso da organização, o desenvolvimento da liderança e da inclusão ou integração.
O diretor de uma empresa de publicidade por mala direta ensina à nova responsável do estúdio as características dos catálogos. Ao se propor o desenvolvimento de seus quadros, toda organização enfatiza especialmente a maneira de fazer as coisas próprias do ramo ou setor de atividade em que atua e a integração de todos os elementos às peculiaridades dos objetivos. |
O desenvolvimento da liderança
Se é certo que a empresa deve dividir sua atividade em diversas funções básicas, também o é que todo esse parcelamento deve convergir para um único e mesmo objetivo.
Antes se afirmou que a divisão do trabalho constitui um dos conceitos prioritários de uma organização, agora deve-se acrescentar que esse conceito está subordinado ao serviço de outro conceito predominante, a organização existe para alcançar objetivos ou finalidades comuns, o que implica a coordenação de esforços entre seus membros.
Quer dizer que não é suficiente para a vida da empresa que cada função seja executada com perfeição técnica e seguindo fielmente as leis próprias que regem sua atividade autônoma, é fundamental que, além disso, se coordenem os esforços de todas as áreas funcionais para a consecução dos objetivos comuns pretendidos.
A fixação dos objetivos e a coordenação dos esforços constituem precisamente a dimensão da atividade diretiva, cujo desenvolvimento é diferente do meramente funcional, por mais decisivo que este seja.
Ao contrário da maioria das funções básicas da organização, que se podem aprender mediante conhecimentos e processos de algum modo independentes da pessoa (isto é, de modo impessoal), o desenvolvimento da liderança (orientar os esforços das diversas funções para um objetivo único) depende diretamente de qualidades ou potencialidades subjetivas, que torna seu desenvolvimento muito mais difícil e dependente de habilidades individuais não facilmente transmissíveis.
Hoje, muitos estudiosos da organização admitem sem reserva que alguns traços pessoais, como a tolerância nas situações conflitantes ou a estabilidade emocional, podem ser mais importantes para o exercício da direção do que as aptidões muito específicas.
Aqui se localiza o nervo sensorial e motor da carreira profissional na organização.
Deve-se determinar que pessoas se encontram inicialmente capacitadas para exercer a liderança e como devem desenvolver-se essas capacidades latentes, e, inversamente, que pessoas apresentam um perfil que encaixa sua carreira somente dentro de uma determinada função.
Essa discriminação não implica em absoluto uma catalogação dos indivíduos e menos ainda de suas qualificações.
Assinala, simplesmente, o ofício para o qual cada pessoa se sente a princípio vocacionada.
Embora a organização exija (juntamente com a divisão do trabalho, os objetivos comuns e a coordenação dos esforços) uma hierarquização da autoridade, que se delimita pelos quadros diretivos e não pelos quadros funcionais, o diretor não é mais nem menos do que o encarregado da produção ou o responsável pelas vendas.
É apenas uma pessoa que realiza uma tarefa apenas diferente daquela que se exerce nas áreas funcionais anteriormente citadas.
Esse critério é fundamental na configuração das carreiras profissionais, pois poderia tornar-se um motivo de conflitos se aplicados numa organização que considera a atividade diretiva de maior valor humano, todos vão querer ser diretores e ninguém quererá dedicar-se científica e seriamente às atividades funcionais que deve exercer.
O desenvolvimento da capacidade diretiva, precisamente por sua estreita vinculação com as características pessoais mais profundas, não é transmissível como os conhecimentos objetivos (da matemática ou química, por exemplo).
Não obstante, a vida futura da organização depende de sua potencialidade para disseminar e fazer crescer em todos os seus níveis as qualidades humanas exigidas para se coordenarem os esforços funcionais.
Pode-se assegurar que o desequilíbrio entre o desenvolvimento das habilidades funcionais e o desenvolvimento da atividade diretiva compromete seriamente a eficácia da organização, é possível que cada função se desenvolva bem em seu próprio campo, mas a organização não alcançará o objetivo comum para o qual cada função foi em princípio programada (ver o diagrama “Desenvolvimento da atividade diretiva”).
A figura põe em evidência as quatro ordens de variáveis que fazem parte do trabalho de liderança, já que, para se realizar uma atividade diretiva exigem-se capacidades pessoais para cujo desenvolvimento não basta a transmissão pura e simples de conhecimentos objetivos. Estes são insuficientes para explicar a complexidade das variáveis que a figura ilustra e a forma pela qual se inter-relacionam. Assim, o desequilíbrio entre o desenvolvimento das habilidades funcionais e o da capacidade diretiva compromete a eficácia da organização, já que não se alcança o objetivo comum para o qual cada função foi programada.
Quando o diretor comenta a dificuldade da tarefa que delegou aos operários da equipe de telecomunicações. Está consciente das três qualidades do comando: a consistência (que permite superar o cansaço próprio de toda execução), a confiança nos outros (que torna possível o trabalho em equipe, a delegação de funções e a coordenação de esforços), e a fortaleza (para superar os obstáculos). |
Conteúdo da ação diretiva
O objetivo desse trabalho é simplificar o complexo problema do desenvolvimento da capacidade de liderança, embora isso implique deixar de lado assuntos importantes.
A ação diretiva se exerce por meio de três atividades sequenciais:
- o diagnóstico (ver com clareza qual a situação em que o indivíduo se encontra),
- a decisão (determinar qual a meta a perseguir),
- o comando e a execução (conseguir que todas as pessoas da organização dirijam seu trabalho para a meta proposta).
As três atividades exigem uma série de capacidades que devem ser desenvolvidas pelo homem que deseja assumir o comando.
No que se refere ao diagnóstico, o homem deve adquirir a qualidade de objetividade, que lhe permita encarar os fatos como realmente se apresentam.
Isto exige que o indivíduo, de certa maneira, deixe de lado sua própria pessoa, suas preferências e preconceitos, já que precisa de suficiente objetividade para encarar os fatos se quiser ser depois eficaz para mudar as coisas.
Essa objetividade deve relacionar-se de maneira especial às oportunidades de decisão que os fatos lhe proporcionam assim como às ameaças que podem impedi-lo de aproveitá-las.
Ora, nesse particular, a objetividade deve, por sua vez, ser acompanhada de outra qualidade ainda mais difícil de adquirir-se, qual seja a mesma objetividade porém agora relacionada com as próprias potencialidades individuais para aproveitar a oportunidade ou superar a ameaça.
Essa objetividade relacionada aos próprios recursos recebeu o nome de humildade, característica paradoxalmente imprescindível em todo aquele que pretende liderar com acerto.
No que se refere à decisão, o diretor deve desenvolver aquilo que classicamente se denominou magnanimidade.
Se a objetividade e a humildade no diagnóstico exigem do diretor uma postura realista, a decisão da meta a perseguir impõe-lhe outra postura só aparentemente oposta, a postura idealista.
O realismo no diagnóstico e o idealismo na decisão são duas qualidades que se inter-relacionam e devem harmonizar-se como os movimentos de sístole e diástole, próprios de todo processo vital.
Se pela objetividade e humildade o homem se apega às realidades fáticas, pela magnanimidade se coloca em condições de superá-las.
Para evitar possíveis equívocos, é preciso dizer que uma meta não é magnânima só pelo fato de se poder medir em grandes cifras, conceito materialista contra qual deve precaver-se até mesmo a empresa mercantil.
A magnanimidade sente-se mais à vontade nas decisões que se movem na ordem do ser, dificilmente quantificável, menos adequada àquelas que se referem à ordem do fazer e, menos ainda, à ordem do ter, que deve ser sempre de menor valor para o homem.
Caso se deseja conseguir os meios necessários para atingir as metas magnanimamente propostas, apesar dos riscos que implicam, a magnanimidade exige por sua vez outro movimento de sístole, de retirada, que se denomina audácia, a qual consiste na estabilidade emocional para executar as ações exigidas, por mais difíceis que se apresentem.
A magnanimidade sem a audácia, isto é, sem a disposição para dar os passos necessários a despeito dos riscos, não recebe o nome de idealismo (ideia que se pode tornar realidade) mas de utopia (ideia que não se concretizará).
Dessa forma, a magnanimidade, como empenho para o êxito, tem necessidade do contraponto da audácia, enquanto capacidade de risco.
Finalmente, o comando, (e a execução), atividade diretiva pela qual se impelem os homens (e a si mesmo) para a consecução dos objetivos fixados, requer por sua vez três qualidades imprescindíveis:
- a constância (que supera o próprio cansaço),
- a confiança nos outros (que torna possível o trabalho em equipe, a delegação de funções e a coordenação de esforços) e
- a fortaleza (tanto para superar os obstáculos como resistir nos momentos mais difíceis).
Para entender perfeitamente como se consolidam essas diversas potencialidades da ação diretiva, é preciso acrescentar, de um lado, que a confiança no comando se encontra estreitamente vinculada à audácia na decisão, pois a confiança nos outros exige o risco de equivocar-se com eles.
Essa vinculação é ainda mais estreita entre a humildade do diagnóstico e a fortaleza do comando, quem não é humilde diante dos próprios êxitos não poderá depois ser forte diante dos fracassos.
Por isso a fortaleza se relaciona por sua vez com a constância, pois esta constitui seu mais valioso efeito (ver o quadro “Qualidades diretivas e suas relações elementares”).
As capacidades diretivas enunciadas referem-se ao nível do ser do indivíduo.
Se o projeto de vida bem entendido deve começar a partir desse nível, no caso específico de uma pessoa que se prepara para desempenhar algum cargo de liderança na organização, esse nível de ser, assim como as transformações e aperfeiçoamentos pessoais consequentes, adquirem ainda maior importância por um duplo motivo: (i) pelo projeto global da vida e (ii) por causa da carreira específica de direção.
O desenvolvimento da inclusão
O desenvolvimento pessoal com frequência provoca o efeito da força centrífuga, pode involuntariamente fazer que o indivíduo abandone a organização que, paradoxalmente, promoveu o seu desenvolvimento e abriu-lhe oportunidades de melhor posição noutras empresas.
Por isto é tão importante que não se realizem programas de desenvolvimento nas dimensões da função, do setor e da direção se não se criam, ao mesmo tempo, condições satisfatórias para que o desenvolvimento pessoal integre a pessoa dentro da organização, do contrário, dificilmente evitar-se-á que a empresa se torne concorrente de si própria.
A inclusão é o conjunto de circunstâncias que fazem a pessoa sentir-se como parte importante da organização e perfeitamente integrada nela.
Harmonizar a capacidade diretiva com o desejo de inclusão
Aqueles que enfrentam os problemas relativos ao desenvolvimento profissional de seus subalternos precisam cuidar, de maneira especial, que o desenvolvimento na linha da direção se encontre em harmonia com o desenvolvimento no caminho da inclusão.
Os fenômenos provocados pelos diretores que não se acham verdadeiramente integrados na organização acabam, no final das contas, se tornando insolúveis.
Deve-se portanto, procurar que o desenvolvimento na organização não só se realize em sentido de baixo para cima (categoria diretiva), mas também, ou mais ainda no sentido de fora para dentro (grau de inclusão).
O peso na organização, a confiança de que se é objeto, a participação na tomada de decisões, o valor que se dá aos conselhos e às opiniões informais, são aspectos que representam claras configurações de inclusão.
De alguma forma isso independe do nível de autoridade que se detém dentro da hierarquia da empresa, do nível de autoridade legal ou formalmente possuído, prerrogativas dos escalões diretivos.
E, ao mesmo tempo, o contrário também é certo, não são raros os casos em que quem tem mais poder dentro da empresa acaba sendo, contraditoriamente o mais alienado dela, como se observa ao avaliar a carreira profissional de muitos altos executivos, que se acham muito mais a mercê da força centrífuga do mercado de trabalho do que da centrípeta de integração na empresa.
Modelos de desenvolvimento pessoal
Foi projetado um modelo tridimensional, no qual se podem apreciar as possibilidades de carreira numa organização (ver o gráfico “Modelo tridimensional de uma organização”) dentro de três das quatro dimensões a que antes nos referimos: função (à qual se poderia assemelhar ao setor), categoria e inclusão, donde se conclui que a carreira pode desenvolver-se tangencial, radial ou verticalmente.
Contudo, o desenvolvimento da carreira nessas quatro dimensões não é tão simples como um modelo imaginativo poderia sugerir.
Acontece que os estímulos usuais na empresa para acelerar a carreira na linha da categoria de direção (verticalmente) se contrapõem de certa forma aos estímulos exigidos para desenvolver a carreira na linha da inclusão (de fora para dentro ou radialmente).
Para incentivar seus diretores no progresso de baixo para cima (categoria), as organizações agem por meio daquilo que se denomina necessidades exclusivas (que aqui se chamarão desagregadoras), isto é, aquelas cuja satisfação por parte de alguns exige a insatisfação por parte dos demais.
Assim acontece com o dinheiro (se todos possuem muito, passará a valer menos, como provam os processos inflacionários), também com o poder, o prestígio, a posição ou status e a fama, que ao serem compartilhados com outros, tornam-se mais diluídos.
Em compensação, a carreira na linha da inclusão deve ser incentivada mediante aquilo que se chama precisamente necessidades inclusivas (que aqui se denominarão associativas), as quais, para sua satisfação, exigem, serem compartilhadas com os outros, como acontece no caso da saúde, da segurança (como garantia de permanência no emprego), a amizade e o relacionamento cuja participação com os outros, longe de diminuir sua posse, aumenta.
Equilíbrio entre as motivações associativas e as desagregadoras
A organização deve cuidar para que se harmonizem num equilíbrio ótimo ambos os grupos de motivações para que o desejo de ascender em seu seio (pela ênfase nas motivações desagregadoras) não provoque depois o desejo de abandoná-la (porque não se incentivaram as motivações associativas).
Em caso de conflito, a organização deve optar pela satisfação das necessidades associativas, evitando as desagregadoras.
Esse equilíbrio é indispensável, sobretudo se a empresa persegue seriamente um futuro de estabilidade.
Em tal caso, integração dos homens, seu sentido de constituir elemento importante, é imprescindível, pois se podem então desenvolver talentos e capacidades específicas, inclusive quando essas habilidades não têm um valor prático imediatamente previsível para a organização que adquire assim a flexibilidade necessária para enfrentar futuros desafios.
Por sua parte, o indivíduo consegue maior versatilidade, é sabido que, quanto mais tempo uma pessoa permanece em uma organização dinâmica, mais fácil será encontrar nela um posto em que seu trabalho seja mais valorizado.
Dessa forma, a lealdade à empresa e o baixo índice de rotatividade ou mudança de empregos constituem parâmetros muito significativos para medir o trabalhador e a empresa.
A organização precisa de indivíduos que nela façam carreira, que estejam dispostos a viver a vida da organização, lançar a sua sorte com a ajuda da empresa, e ambas essas posturas poderão beneficiar-se muito, pois uma depende da outra.
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Fonte: Carlos Llano Cifuentes – Doutor em Filosofia pela Universidade de Estudos de São Tomás de Roma, presidente e fundador da IPADE (México) e Professor Comportamento Humano na Organização.