A organização é a principal base sobre a qual uma empresa deve fundamentar seu funcionamento.
Diante disso, é tarefa prioritária da direção criar condições que facilitem as mais adequadas inter-relações no ambiente da coletividade empresarial para fazer frente ao desafio tecnológico.
Em qualquer sociedade humana distinguem-se três tipos de realidades que, no conjunto, constituem essa realidade complexa que se denomina organização:
- Relações interpessoais – inter-relações – conscientemente estabelecidas para coordenar os esforços ou ações individuais a fim de atingir os objetivos.
- Relações entre os componentes da organização que se manifestam de maneira espontânea, não planejada.
- As próprias pessoas que constituem ou integram a organização.
Para referir-nos brevemente a cada uma dessas realidades utilizaremos respectivamente os conceitos de sistema formal (ou organização formal), espontâneo (ou sistema informal) e pessoas integrantes da organização (ou elementos da organização).
Vamos explicar em detalhe o significado desses conceitos e quais os aspectos da realidade inseridos em cada um deles.
Sistema formal de uma organização
O sistema formal inclui o conjunto de relações e interações estabelecidas de maneira consciente e explícita para coordenar as atividades das pessoas que integram a organização.
Visa a determinar aquilo que se espera de cada pessoa, que função deve desempenhar bem como estipular o que cada uma vai receber da organização.
Por isso, em última análise, é preciso distinguir dois componentes do sistema formal: o operacional (que exprime qual a contribuição da pessoa em virtude da função que lhe é atribuída na organização) e distributivo (ou sistema retributivo ou de incentivos, isto é, o que cada pessoa vai receber da organização.
Evidentemente, há casos em que o sistema operacional determina com toda a precisão os deveres do indivíduo para com a organização.
Imagine-se, por exemplo, o operário ao qual se pede que produza determinado número de peças por dia.
O mesmo acontece com o sistema distributivo: determinar para um operário a quantia de sua remuneração por certo trabalho realizado.
Na maioria dos casos, tanto um como outro sistema podem não apresentar esse grau de precisão.
Em geral, quanto mais importantes são as decisões que uma pessoa deve tomar numa organização, menor o grau de concreção com que se determinam suas atividades através do sistema operacional.
Por isso podemos dizer que a atividade real de uma pessoa numa organização é determinada apenas parcialmente pelo sistema operacional.
Em geral, essa atividade real tem duas componentes distintas: a requerida e a espontânea (não exigida formalmente).
A atividade requerida é aquela que o sistema determina; ao passo que designamos espontâneas a todas as ações não diretamente especificadas no sistema.
Por exemplo, enquanto o operário realiza uma série de movimentos operando uma máquina, como lhe pede o sistema operacional, pode estar falando com outros, ou pensando no último filme que viu ou, ainda, na próxima partida de futebol, etc.
Todas estas ações diferentes dos movimentos que realiza para operar a máquina seriam atividades espontâneas.
Em princípio, essas atividades são as que produzem interações ou relacionamentos ligados ao que chamamos sistema informal.
Hoje em dia quase todos sofremos as consequências das limitações dos sistemas operacionais, devido ao fato de que tais limitações são frequentemente utilizadas pelos trabalhadores como uma arma em suas reivindicações trabalhistas.
Em muitos casos, as greves não são outra coisa senão a exigência do cumprimento estrito de todos os regulamentos do sistema operacional.
Na mesma linha de fenômenos, temos uma ampla experiência da tática seguida por um trabalhador ou grupo de trabalhadores quando querem pôr seu chefe imediato em apuros.
A tática é muito simples, sendo conhecida como operação-tartaruga: limitar-se a cumprir o mais literalmente possível as ordens que recebem desse chefe.
Dependendo dos casos, os resultados desse tipo de atuações podem chegar a ser verdadeiramente cômicos ou dramáticos.
A única coisa certa é que nunca serão o que o superior hierárquico esperava conseguir.
O exemplo soviético
Um exemplo bastante eloquente que põe em destaque as limitações dos sistemas formais a nível de todo um país, pode encontrar-se em algumas declarações de Nikita Kruschev sobre a indústria soviética e o estado em que a encontrou na morte de Stálin.
Parece que para os diretores de empresas russas o cumprimento das cotas de produção estabelecidas pelas autoridades de planejamento era tema da maior importância.
Certamente, é fácil entendê-los se se recorda a dureza com que Stálin costumava tratar as faltas de colaboração com os objetivos do Estado.
Segundo as declarações de Kruschev, parece que aqueles diretores haviam desenvolvido todo um conjunto de artimanhas a fim de assegurar que as cotas de produção fossem alcançadas em qualquer hipótese.
Ele menciona alguns casos concretos que chegam às raias da comicidade.
Um deles: as cotas de produção para a indústria de fabricação de móveis estabeleciam-se em dinheiro (algumas cifras específicas em rublos).
Ao que parece, era muito mais fácil alcançar a cota com base na produção de grandes poltronas do que produzindo cadeiras simples.
Não é difícil imaginar a situação final: havia grandes estoques de poltronas que ninguém queria comprar, ao passo que todo mundo se queixava da escassez de cadeiras no mercado.
O sistema espontâneo ou informal de uma organização
Já introduzimos a descrição desse sistema ao falar das atividades espontâneas das pessoas, pois são precisamente essas atividades que constituem o sistema espontâneo de uma organização.
Uma organização humana é, pelo menos comparável a um organismo vivo (veremos que é mais do que isto).
Descrições puramente mecânicas, com base em puros processos físicos, não podem explicar a vida e o comportamento dos organismos vivos.
No caso das organizações, tais descrições são equivalentes às que se limitam a visualizar os fenômenos unicamente no plano formalizado, e uma organização vai muito além disso.
Cooperação espontânea
Uma organização inclui todos os tipos de interações intercambiadas entre seus membros.
Naturalmente quase sempre acontece que a maioria das relações no plano não formalizado ou espontâneo sejam ou triviais ou pouco importantes do ponto de vista empresarial (João, chefe da contabilidade, se apaixonou pela moça que trabalha de auxiliar no departamento de vendas; Luís, chefe de vendas, gosta muito de futebol, etc).
De qualquer modo, devemos reconhecer que é muito difícil antever se, em algumas circunstâncias concretas, um desses relacionamentos aparentemente triviais poderia ser ou não decisivo para a própria organização.
(Quem sabe? Pode ser que Luís consiga um pedido importante em momentos cruciais para a empresa devido à sua amizade com determinado cliente, porque casualmente ambos são apaixonados torcedores do mesmo time de futebol.)
Deixando de lado casos excepcionais, ainda fica de pé o fato de que, pelo menos algumas relações de tipo espontâneo são claramente decisivas dada a sua influência sobre a consecução dos objetivos da organização.
Quer dizer, a própria vida da organização seria impossível se o nível de tais relacionamentos estivesse abaixo dos limites mínimos.
Fique bem claro que não estou dizendo que seja necessário um alto grau de cooperação espontânea para que a organização possa sobreviver.
Estou dizendo que pelo menos um grau mínimo de cooperação espontânea é condição necessária (talvez não fosse suficiente) para a sobrevivência da organização.
Naturalmente, quanto maior a cooperação espontânea, melhor e mais facilmente a organização poderia alcançar seus objetivos, mas esta é uma questão que, no momento, não vamos dilucidar.
Não estamos tratando agora das condições para maximizar, mas das condições mínimas.
Do ponto de vista prático é bem conhecida a transcendência que tem o sistema espontâneo para assegurar um correto funcionamento em qualquer organização.
Por exemplo, sabemos muito bem que as relações de tipo espontâneo entre o diretor de produção e o diretor de vendas têm muita importância na hora de assegurar uma adequada coordenação de ambas as funções em qualquer empresa.
Se ambos os diretores são o que normalmente denominamos bons amigos, há grandes probabilidades de que muitos problemas na área de vendas sejam resolvidos graças a alguns esforços extraordinários na área de produção e vice-versa.
Tudo isso significaria uma boa coordenação entre ambas as funções.
Se o relacionamento entre ambos os diretores fosse, entretanto, do tipo que existe entre inimigos declarados, é mais provável que a coordenação entre produção e vendas chegasse a constituir um problema muito sério.
Na verdade a palavra coordenação é bastante abstrata e inclui uma multidão de pequenas e grandes realidades.
Por isso, mesmo com o risco de parecer repetitivo, gostaria que o leitor tratasse de imaginar o tipo de interações dos executivos em pauta.
No fundo, trata-se de comportamentos tão simples e tão observáveis em todas as partes como a seguinte: suponhamos que o diretor de vendas se aproxime do diretor de produção e lhe diga:
“Olhe, tenho um problema bastante sério.
Pode parecer uma insensatez de minha parte quando, na semana passada, prometi a esse cliente que lhe entregaríamos seu pedido em quinze dias.
O certo é que agora ou lhe envio o pedido no fim desta semana ou vou ficar numa situação bastante desagradável”.
Diante disso, poderiam ocorrer múltiplas respostas ao diretor de produção.
É preciso reconhecer que existe profunda diferença entre respostas do tipo:
“De acordo, homem.
Não se preocupe.
Vou procurar resolver o assunto, embora não seja nada fácil.
De qualquer modo, penso que há solução”.
Ou:
“Não pode ser.
Já estou cheio de você ficar prometendo coisas impossíveis às custas dos meus esforços e dos de meu pessoal”.
Respostas como esta última – ou outras, até mais amáveis, porém na mesma linha – costumam ser o começo de uma espécie de guerra declarada entre alguns diretores.
Quase sempre acabarão discutindo, e tratando de deixar bem claro que a culpa está na incompetência ou nas más intenções do outro.
Esse tipo de discussão inútil constitui aquilo que se chama má coordenação.
Em qualquer organização, o mundo das interações espontâneas é um mundo de realidades bastante simples, não difíceis de antever, ao mesmo tempo, sumamente importantes.
Qualquer diretor com experiência é perfeitamente capaz de avaliar adequadamente esses processos a que estou me referindo.
É um mundo em que as pessoas se mostram amistosas ou hostis dispostas a ajudar ou se fecham em seus próprios problemas.
No mundo das relações formais de coordenação planificada – o sistema formal – é onde as pessoas aparecem simplesmente como chefes ou subordinados – linha ou staff – diretor de produção ou diretor de vendas, etc.
Qualquer diretor com experiência está também consciente do fato de que algum sistema formal – pelo menos um sistema mínimo que especifique quem dá ordens a quem – é necessário em qualquer organização.
Contudo, todos nos damos conta de que não há nenhum sistema formal capaz de incluir todos aqueles aspectos das interações humanas necessários para garantir a consecução dos objetivos que a organização fixou.
Parece que é uma opinião comum o fato de que alguns atributos importantes das interações humanas – precisamente aqueles que em geral consideramos como os mais decisivos para assegurar boas condições dentro da organização – apresentam uma forte resistência ao serem formalizados.
Imagine-se, por exemplo, aquelas atitudes pessoais que vulgarmente chamamos disposição de ajudar os outros ou comportamento amistoso, etc.
Como se podem traduzir essas facetas do comportamento humano em regras explícitas, em normas específicas capazes de regular tais ações para conseguir aqueles resultados?
Acontece, contudo que as regras explícitas e as normas específicas são os elementos com os quais se estruturam os sistemas formais.
Esse tipo de sistema não pode ir além.
Bem sabemos que não é fácil elaborar um conjunto de regras que assegurem a um departamento qualquer da empresa resultados coerentes, como pelo menos alguns dos objetivos específicos de toda a organização.
Aceitando tal dificuldade, a tarefa de formular tal sistema de controle se apresenta pelo menos como factível.
Contudo, se se tratasse de elaborar sistemas operacionais para conseguir coisas como comportamento amistoso, disposição de ajudar os outros ou algo semelhante, qualquer pessoa pensaria logo de saída que a tarefa não é só difícil mas praticamente impossível.
Em resumo, diríamos que uma qualidade mínima no plano das relações espontâneas é condição sine qua non para explicar a vida da organização; é impossível formalizar tais relações ou assegurar essa qualidade mínima de relacionamento através de regras ou preceitos específicos do sistema formal.
Em última análise, estamos reconhecendo que as organizações vivem porque não fazem outra coisa senão configurar parcialmente algo que já está vivo: relações entre seres humanos vivos.
As pessoas ou elementos integrantes da organização
Ao falar tanto do sistema formal como do sistema informal fica bem evidente que tais sistemas se compõem de atividades ou interações humanas exigidas ou reguladas no primeiro e espontâneas ou não formalizadas no segundo.
Quase sem querer, o substantivo atividade parece ter mais peso do que o adjetivo humana.
Por isso não é raro, em certas ocasiões, definir-se a atividade independentemente de ser realizada por pessoa ou por uma máquina.
Para os propósitos do sistema formal que se limita a regular as atividades muitas vezes expressas por resultados físicos observáveis, a diferença de a atividade ser realizada por uma pessoa ou por uma máquina não parece afetar sua definição.
Assim, por exemplo, um sistema formal que coordena o fluxo de materiais numa fábrica – desde as matérias-primas até o produto acabado para os depósitos – prescreverá um conjunto de operações em sequência.
Se essas operações vão ser executadas por uma máquina – correia transportadora, por exemplo, ou por alguns operários com empilhadeiras, não faz diferença alguma do ponto de vista do sistema operacional.
Naturalmente, nosso senso comum nos dirá que a diferença entre um e outro caso é muito importante, e que essa diferença afetará profundamente as interações do sistema.
É claro que ninguém nunca viu, por exemplo, um conjunto de correias transportadoras fazendo greve; os operários que manobram as empilhadeiras certamente já participaram de muitas, e ninguém se surpreende com isto.
Em última análise essas diferenças são tão evidentes que até parece perda de tempo falar delas.
Mas é justamente por isso que não devem ser descartadas, o que amiúde acontece quando não se tem o devido cuidado na hora de teorizar sobre as organizações.
Quando se trata de pessoa é preciso levar em conta três diferentes planos de comportamento, por sua vez, inter-relacionados:
- Atividades físicas (através das quais interage com o ambiente).
- Conhecimento (através do qual configura suas atuações).
- Motivação (impulso que impele à ação).
Ao observar a atuação de uma pessoa, vemos suas atividades físicas (o que faz), mas a energia impulsora (os estímulos) de seu comportamento se encontra no conhecimento e na motivação.
A operação física de uma máquina depende unicamente das circunstâncias exteriores: se estas mudam, a operação também; ação idêntica realizada por uma pessoa pode perfeitamente mudar, embora as circunstâncias externas permaneçam as mesmas.
Por isso, para conhecer como se comportará uma máquina, basta ter informações sobre a relação entre as circunstâncias exteriores (inputs) e suas operações (outputs).
Essa informação é suficiente para predizer o resultado do desempenho mecânico: verificando-se um certo input sempre e necessariamente se dará um determinado output.
Mas no caso das pessoas há duas variáveis internas (conhecimento e motivação) que determinam suas reações.
O tema se complica ainda mais quando nos detemos a considerar que a realização de atividades físicas por parte de uma pessoa sempre supõe um acúmulo daquilo que chamamos experiências.
Ou seja, um operário que transporta materiais oito horas por dia está tendo um conjunto de experiências vitais (que podem ser enfadonhas, divertidas ou indiferentes).
Mas a experiência é precisamente a fonte de onde procedem as mudanças nos conhecimentos e nas motivações.
Por isso, qualquer tentativa de explicar o funcionamento das organizações humanas deve levar em conta as seguintes variáveis:
- As ações ou atividades que se organizam ou coordenam.
- As mudanças no conhecimento que ocorrerão como consequência daquelas ações realizadas pelas pessoas (aprendizagem cognitiva).
- As mudanças também experimentadas nas motivações dessas pessoas (aprendizagem motivacional).
Se, ao formular teorias sobre o funcionamento das organizações humanas prescinde-se dessas aprendizagens (ou de uma delas), a teoria resultante só será válida caso essa aprendizagem não ocorra na realidade, quer dizer, nesse exemplo concreto, o conhecimento e/ou a motivação das pessoas não se modificam em consequência de sua maneira de agir.
Sem dúvida, essa teoria talvez seja uma boa aproximação da realidade em alguns casos concretos, mas é evidente que, na maioria das organizações humanas, faz-se necessário aplicar modelos ou teorias que não partam desse pressuposto, isto é, da não variação cognitiva e motivacional dos membros da organização.
Não resta dúvida que, na maioria dos casos, os membros de uma organização aprendem em ambos os planos precisamente como consequência de seu relacionamento com a organização: pelas experiências ligadas àquilo que ali devem fazer e àquilo que ali recebem, etc.
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Fonte: Juan Antonio Pérez López – É atuário de seguros pela Escola Central Superior de Comércio de Madri, doutor em Business Administration pela Harvard University e professor titular de Comportamento Humano na Organização no IESE.