Como concepção global, uma empresa é muito mais do que uma simples fonte de produção de riqueza.

A atividade empresarial compreende a dignificação do ser humano e se converte no único campo possível em que este pode realizar-se plenamente.

A falha fundamental do modelo psi­cossociológico se deve ao fato de que seu conceito sobre a motivação hu­mana é incompleto.

Na verdade, sua abertura para as realidades que afetam os motivos internos do comportamento sig­nifica um enorme avanço com relação ao modelo mecanicista.

Mas esses motivos devem ser objeto de uma nova conceituação, sem a qual não se pode explicar a introjeção de certos objetivos que não se­jam aqueles do próprio indivíduo.

Já vimos que os motivos internos sub­dividem-se em duas categorias: intrínse­cos e transcendentes.

Os motivos intrín­secos só dependem da vontade pessoal sem qualquer vinculação com o exterior.

Neste plano de motivos não é cabível a interiorização de objetivos externos e/ou estranhos ao sujeito, já que esse fenôme­no é provocado por estímulos ou agentes de fora do indivíduo.

Neste processo de interiorização atua outra categoria de mo­tivos – os transcendentes.

Uma aprendizagem que desenvolva os motivos internos pode perfeitamente ser negativa, se o desenvolvimento dos mo­tivos intrínsecos se faz às custas do arre­fecimento dos motivos transcendentes.

É precisamente esse fenômeno que ocorre com as pessoas quando atuam de tal ma­neira que acabam perdendo sua humani­dade, suas qualidades morais.

Esse processo é o que se encontra por trás dos ca­sos verdadeiramente trágicos de tantas figuras históricas cuja crueldade se tornou proverbial, sabendo-se que, em sua juventude, revelaram-se pessoas sensíveis, incapazes de prejudicar os outros.

Em tons menos dramáticos, vemos aparecer com frequência o mesmo fenômeno quando um diretor aprendeu a despedir gente, ou um vendedor aprendeu a enganar os clien­tes sem que estes se deem conta, e essa aprendizagem os faz ao mesmo tempo mais hábeis no plano tático para realizar estas coisas e menos sensíveis aos efeitos negativos de sua ação nos outros seres hu­manos.

A consecução desta eficácia não justifica a perda de humanidade.

Limitações do paradigma psicossociológico

A primeira vista, as consequências des­sas limitações são mais graves do que pa­recem.

Não lhes falta apenas equipamen­to conceituai para abordar os processos de introjeção de objetivos, mas também:

  • Falta critérios explícitos para avaliar as metas de ação organizacional do ponto de vista da sua contribuição para o desenvolvimento dos aspectos mais especificamente humanos das pessoas (aprendiza­gem no plano do desenvolvimento afeti­vo dos seres humanos, isto é, em sua aber­tura às necessidades alheias, à aprendizagem do espírito de serviço, sem o qual a convivência dos homens, isto é, as organizações, se torna realmente impossível a longo prazo).

No fundo, o paradigma supõe um pseudo humanismo, que em certas oca­siões, é mais corrosivo do que um mecanicismo meramente técnico que se limita a ignorar os planos psicológicos e morais da pessoa.

A manipulação psicológica – embora bem-intencionada – pode ser mais destrutiva do que a busca da simples eficácia apoiada num esquema técnico ri­goroso.

Em muitas ocasiões as teorias ba­seadas no paradigma psicossociológico implicam – no bojo da própria lógica pa­radigmática levada às suas últimas con­sequências – uma concepção utópica do homem e da sociedade.

O mecanicismo supõe uma conceituação parcial (mas não utópica) e realista (embora um realismo limitado por se tra­tar de modelo incompleto).

Talvez por es­sa razão, os diretores de empresa, que atuam num ambiente pouco afeito às uto­pias, tendem a interpretar as ideias que aparecem no paradigma psicossociológi­co à luz de uma perspectiva mecanicista.

Essa interpretação os leva a concessões no plano da atratividade (conseguir com boas maneiras a aceitação daquilo que se deve fazer na empresa, procurando que as pessoas se sintam a mais satisfeitas pos­sível com aquilo que cada um deve fazer), mas desde que a eficácia não seja preju­dicada.

Naturalmente, quando o ambiente externo endurece e a consecução da eficácia se torna mais difícil, a primeira coi­sa a ser lançada ao mar como peso inútil são todas essas políticas implantadas pa­ra contentar as pessoas.

No fundo, oculta-se a ideia de que a eficácia se con­segue pelo caminho duro – os sistemas formais são os que garantem a produti­vidade – e de que a atratividade, isto é, a satisfação ligada àquilo que se faz na empresa, é algo muito digno de ser conseguido, mas não está muito claro que ajude na consecução da produtividade quando esta é realmente necessária.

Muitos diretores (a maioria?) sentem dessa maneira, e desconfiam que os argumentos contrários dos teóricos do paradigma em pauta, no fundo, se apoiem numa concepção utópica e fora da realida­de do ser humano.

Sem dúvida alguma, estes diretores se surpreenderiam se soubessem que estas mesmas suspeitas foram expressas, no final de sua vida, por um dos teóricos de maior peso entre os que contribuíram para o desenvolvimento deste paradigma.

Fritz Roethlisberger em sua obra póstu­ma – The Elusive Phenomena – chega a dizer, a respeito de seu próprio enfoque:

“A noção de que uma realidade empresarial pode ser mudada simplesmente através de um esforço criativo de comunicação entre as pessoas envolvidas, de­vo confessar que é idealista…

Essa noção acaba levando à conclusão, a que chegou Platão, de que se os reis fossem filósofos e os filósofos reis, então se conseguiria as condições ideais para o governo do povo”.

  • Falta de critérios explícitos para distin­guir entre a motivação real das pessoas e sua motivação potencial.

Em outras pa­lavras: no paradigma não há distinção en­tre as necessidades autênticas das pessoas e seus caprichos, desejos, interesses imediatistas, etc.

Esta confusão é que dá ori­gem à concepção utópica do ser humano à qual nos referimos no ponto anterior.

A atratividade de uma organização é determinada pela satisfação autêntica das pessoas – por sua real satisfação no pla­no dos motivos internos.

Em termos co­loquiais diríamos que a atratividade re­flete “aquilo que uma pessoa gosta, aqui­lo que está fazendo – aquilo que está vivenciando por pertencer à organização”.

É claro que as organizações devem pro­mover a satisfação externa através dos in­centivos, tornando-se, por isso, eficazes.

Obviamente também não podem ficar in­diferentes no plano interno, pois as pes­soas que ali trabalham precisam sentir-se integradas numa atividade e ambiente gratificantes.

Quer dizer, quanto maior a atratividade tanto melhor para o colaborador e/ou para a organização em seu contexto global.

A concepção social de base utópica à qual nos referimos antes, consiste preci­samente em supor que ao maximizar a atratividade, se maximizaria também a eficácia.

O mais elementar senso comum nos diz que não é assim: em qualquer or­ganização na qual a pessoa realizasse a to­do momento aquilo de que mais gosta – a anarquia pura – a eficácia desapareceria ipso facto.

Temos que aceitar como um truísmo da condição humana que o melhor para uma pessoa não é necessariamente aqui­lo que mais a motiva a curto prazo.

Ou seja, a satisfação das necessidades que uma pessoa afirma ter em determinado momento pode ser a melhor maneira de incapacitá-la para atender suas verdadei­ras necessidades físicas, essas que no mo­mento nem percebe.

O delicado processo pelo qual uma pessoa aprende sobre suas necessidades reais deve ser levado em con­ta pelas organizações se quiserem sobre­viver.

Já que sua estabilidade depende do seu papel de instrumento para satisfazer necessidades humanas, serão mais instá­veis na medida em que se orientem para a satisfação de necessidades aparentes em lugar de orientar-se para as necessidades reais.

É um dos fatos mais frequentemente repetidos na história que as pessoas acabaram rebelando-se contra os dema­gogos – governantes que sempre procuraram proporcionar tudo o que se lhes pe­dia – os quais ou sucumbiram, se eram fracos, ou tiveram que converter-se em tiranos para sobreviver.

A única via de síntese que permite conjugar o crescimento da atratividade com o da eficácia é a que passa pela interiorização dos objetivos da organização por parte das pessoas.

Essa interiorização co­mo já dissemos antes, exige que se recor­ra ao plano dos motivos transcendentes, pois somente aí opera a mão invisível que faz coincidir aquilo que a organização procura (satisfazer necessidades huma­nas) com aquilo que motiva a pessoa a atuar (a satisfação das necessidades dos outros).

Na teoria das motivações huma­nas configura-se que o mais importante para a pessoa é o desenvolvimento de sua afetividade, em que atuam os motivos transcendentes.

Para as organizações, o mais importante então é que seus mem­bros se desenvolvam nessa dimensão afe­tiva, ressaltando desse modo a influência dos motivos transcendentes em suas ações.

É isso que vai facilitar a introjeção dos objetivos empresariais nos indi­víduos, contanto que estes sejam coeren­tes com as suas aspirações pessoais: sa­tisfação das necessidades reais da melhor forma possível.

Este plano de análise é o que descreveremos no paradigma ou modelo antropológico, que acrescenta um novo nível de conceitos.

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Fonte: Juan Antonio Pérez López – Atuário de seguros pela Escola Central Superior de Comércio de Madri, PhD em Business Adminis­tration pela Harvard University e professor titular de Comportamento Humano na Organização no IESE.

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